Utilizo sistema rádio localizador em minhas aves desde 2006 e somente
por duas ocasiões realmente exigi o máximo do equipamento. Pequenos sustos,
para quem voa aves do gênero Falco são comuns no dia a dia e devemos estar
preparados para possíveis imprevistos no campo. Neste artigo vou escrever sobre
os elementos que compõem a Telemetria e também a forma como eu a opero e sempre
funcionou.
Este sistema de localização teve origem pós Segunda Guerra Mundial onde
pilotos de teste da Marinha dos Estados Unidos eram monitorados em suas missões.
No início da década de 60 ocorreram os primeiros relatos do seu uso para
pesquisas em animais de vida livre e na década de 70 já era utilizada por
falcoeiros europeus e norte americanos. No Brasil ela é usada em projetos de
pesquisa desde os anos 90 e por falcoeiros, no início do ano 2000.
O sistema mais utilizado para receptores é o da faixa de ondas de radio
Very High Frequency, mais conhecida como VHF. Embora esta faixa cubra um
espectro bastante largo (30 – 300 MHz, lembrando que 1 MHz = 1.000 KHz), a
maioria dos equipamentos transmissores operam na faixa dos 170 a 218 MHz, e
oferecem uma boa relação entre o alcance do sinal e a durabilidade da bateria.
Neste sistema, o sinal de rádio é emitido na forma de pulsos pelo transmissor e
é captado diretamente pelo receptor, conectado a uma antena. Cada transmissor
deve operar em uma freqüência única e com uma distância razoável
(aproximadamente 10 KHz) de outros transmissores utlizados na mesma área para
evitar confusão entre indivíduos a serem localizados.
O terceiro componente do equipamento básico de Telemetria é a antena,
responsável por interceptar o sinal emitido pelo transmissor e retransmiti-lo
magnificado para o receptor. Normalmente ligada ao receptor por meio de cabos
coaxiais, a antena pode ter diversos tamanhos e configurações, que irão influir
diretamente na magnificação do sinal captado e na sua portabilidade. Quanto
maior for o porte e complexidade da antena, maior será o ganho de sinal, porém
maior será a dificuldade no seu manuseio.
Adicionalmente, as antenas podem ser divididas em direcionais e
omnidirecionais. Direcional se refere à capacidade da antena em captar mais
eficientemente o sinal transmitido de acordo com sua orientação em relação ao
transmissor, já as omnidirecionais possuem um padrão de captação homogêneo em
todas as direções, podendo ser utilizadas apenas para detectar presença ou
ausência de sinal. As antenas direcionais comumente utilizadas são nos modelos
Adcock e Yagi.
Ilustração dos principais tipos de antena utilizadas em telemetria, sendo A, B e C omnidirecionais e D e E direcionais. |
A Adcock, também conhecida como antena em “H”, em função do seu formato,
possui dois elementos paralelos, aumentando relativamente o ganho de sinal.
Apresenta a melhor relação custo-benefício entre as antenas direcionais, em
termos de ganho, portabilidade e preço. A modelo Yagi por sua vez, compreende todas
as antenas com três ou mais elementos paralelos, oferecendo melhores
performances em ganho e direcionalidade do sinal. No entanto, excetuando-se a
antena com 3 elementos, os modelos Yagi são de difícil manejo. A empresa
norte-americana Marshall Radio Telemetry desenvolveu e comercializa o modelo
Yagi de três elementos dobrável e retrátil muito compacta e fácil de carregar.
Em antenas direcionais o padrão de captação é constituído basicamente
por dois campos de pico diametralmente opostos: um mais forte, chamado de
“frente” da antena e um mais fraco, chamado de “fundo” da antena. Tais campos
são separados em ambas as extremidades por lados “surdos” ou nulos da antena,
onde há apenas uma mínima captação de sinal. Dessa forma, para um volume
constante no receptor, o sinal será escutado com maior intensidade quando a
frente da antena estiver voltada para o transmissor. É este padrão diferenciado
que permite a identificação do sinal e localização da ave.
É importante lembrar que através do sistema de recepção de VHF (receptor
e antena direcional) pode-se estimar apenas a direção do transmissor, de onde
seu sinal será captado com maior intensidade. A determinação de sua distância
pode ser feita apenas subjetivamente e de forma qualitativa (próximo ou distante)
e, mesmo assim, dependendo da experiência do operador.
A acurácia de uma localização depende principalmente da qualidade das
estimativas de direção do transmissor. Tais estimativas são suscetíveis não
apenas ao erro humano, mas também sofrem a influência das diversas
interferencias (reflexão, difração, polarização etc) a que são submetidos os
sinais dos transmissores.
Em campo, quando for necessário utilizar o equipamento, procure observar
o relevo do local de forma a posicionar-se em pontos onde a recepção de sinal
seja avantajada. Pontos mais altos e de vegetação mais aberta normalmente
oferecem as melhores condições de recepção. Evite posicionar-se próximo a
obstáculos ou fontes de interferência eletromagnética. Cuidado com a montagem e
empunhadura corretas da antena direcional, lembre-se que cada modelo de antena
tem um padrão de captação diferente (vide manual do equipamento) e erros desta
natureza podem provocar localizações enganosas. Um giro de 360 graus é
recomendável para confirmar a direção geral de maior intensidade do sinal.
Ajuste o volume do receptor, de forma que seja possível definir com clareza os
campos de pico e nulo de sinal da antena. Lembre-se que ao diminuir o volume, o
arco de captação formado pelo campo de pico com maior intensidade de sinal
(“frente” da antena) será cada vez menor, facilitando a determinação de sua
direção. Em caso de dúvidas quanto à direção precisa do sinal, utilize a reta
que representa a bissetriz do ângulo formado pelos limites de captação do
sinal, ou o início de ambos os lados “surdos” da antena. Eu utilizo duas formas
de rastreio, o terrestre e alguns princípios de triangulação, normalmente os
dois em conjunto.
Estimativa da origem do sinal pelo método de bissetriz, utilizando os limites dos lados "surdos" da antena para formação de um ângulo. |
O rastreamento terrestre é simples, consiste em seguir o rumo de maior
intensidade de sinal até o estabelecimento de contato visual com a ave. A
triangulação é possivelmente a técnica de localização por telemetria mais
utilizada, ela consiste em: escolher dois ou mais pontos de qualidade na
captação do sinal; estimar suas respectivas direções de maior intensidade do
sinal; encontrar o ângulo de visada dessas direções e finalmente calcular a
localização do transmissor, através dos pontos de encontro das retas
correspondentes aos ângulos medidos em cada ponto. Dependendo do número de
pontos utilizados para a triangulação, tais cálculos podem ser de trigonometria
simples (dois pontos) ou baseados em estimadores de maxima verossimilhança
(três ou mais pontos). Apesar de sua aparente simplicidade, a triangulação é um
processo cuja qualidade depende de uma série de detalhes na escolha dos pontos
onde serão estimadas as direções.
Agora surge a pergunta:
- Você faz todos esses cálculos de trigonometria e verossimilhança?
É ÓBVIO... Que não!
Claro que para treinar e conhecer a capacidade do equipamento já
fiz diversos testes e cálculos mas
nunca cheguei a ponto de precisar calcular a localização com toda esta precisão
utilizando bússolas, mapas etc. Somente utilizando o cruzamento entre os pontos
localizados na angulação já foram o suficiente pra mim.
A diferença entre os ângulos de visada medidos em cada ponto é, além de
um fator que influi na precisão da localização, uma forma prática de avaliar-se
a distância desses pontos em relação ao transmissor. Até mesmo intuitivamente é
possível perceber que, dado um ângulo de visada obtido no primeiro ponto de
triangulação, quanto maior o deslocamente necessário até um segundo ponto, para
que o ângulo de visada se modifique, por exemplo, em 30 graus, tanto maior será a distância da localização do transmissor. Trocando em miúdos, Quanto mais
distante a ave estiver, maior deverá ser a distância entre os pontos de
angulação.
Conforme mencionado anteriormente, em condições semelhantes, quanto mais
próximo do transmissor, melhor será a qualidade do sinal, mais acurada a
estimativa de sua direção e mais preciso o cálculo de localização do
transmissor.
Apesar da relevância dessas considerações, é importante ter em mente que
a localização por meio dessa técnica será sempre baseada em estimativas das
direções de maior intensidade do sinal em cada ponto de triangulação, sendo
então também uma estimativa da real localização do transmissor.
Estimativas de localização por meio de triangulação com três pontos. |